pseudônimo


Proibiram-me e vi pela janela
Vi passar a alegoria
Crianças loucas em alegria
Endeusando uma falsa estrela
Era incandescente e de gás malicioso
Lâmpada da cobiça, luz do penurioso

Fugi e sentei-me já pensando
Como querer um futuro
Andei por ladeiras cogitando
A inspiração esculpida sobre o muro
E como a flor do fogo que cresce e desponta
Resolvi viver o intenso e passar da conta

Porém a vergonha me tatua
Desde que cegonha me concebe nu
Ao rasante no céu azul em tom de euforia
Trouxe-me em desígnio luminoso quão neon
Hei de ser vergonhoso, sabendo o dom
De fazer a arte na argila crua

Quando infante me dispunha
À bel prazer, eu compunha
Como alfaiate se põe a coser
Um ofício eu tinha de saber
Não sei se é pífio ou exímio
É um mundo em meu domínio
 
Pus o pé fora de casa e estava lá
Era uma ideia nebulosa a ser moldada
Via gente e coisa aqui e acolá
Tinha em mãos um papel e uma pena dourada
Uns rabiscos e esboços eram tudo
Daí segui ao léu traçando meu estudo

Discorri as teses que vibravam acaloradas
Revi os conceitos, transformei as chagas
Eram antes intensas confusões
Diziam-se completas as escavações
Não eram achados concisos
Tudo que era errôneo se fazia inciso

A crise abafava a vida em grupo
Os homens não se encontravam
Já havia sim, mil gênios astutos
Mas milagres chulos não adiantavam
Era preciso explodir a defasagem
Enxergar o mundo complexo e suas vertigens

Comecei a ser venturoso pela teimosia
Juntar os trapos luminosos e formar a primazia
Dar ao animal a luz milenar, até então invisível
Como um fogo olímpico, que arde na tocha
Um artefato místico cravado na rocha
E findar-se-ia o marasmo perceptível

Ditador da passividade do curandeiro
Evitar que se chegue ao segundo derradeiro
Na sutileza das letras notei o meio
Insistindo num ínfimo anseio
Encontrei a chave no pico da montanha
A chave que inicia ardilosa façanha
  
Interferi no covil da cobiça mundana
Focos de guerra, condição desumana
A fome que aterra o pensamento
Crianças morrendo a todo o tempo
Como tropas em movimento
Quase me desfiz ao sabor do vento

 Quando vi a tristeza, agi como corisco
Trouxe grande alegria, me fiz são Francisco
Que à sorte me provera com sabedoria
Tive tudo na vida para ser com maestria
E reger a transformação, explicando o fenômeno
Não pude fugir dos vários venenos

Fiz da vida o que devia, além do que podia
E além do que havia, existi para que exista o bem
Não só o simples bem santo
Um bem repleto que reprime o pranto
Só algo ocultei e insisti em assim ser
A identidade que os fazia ninguém podia saber

Era eu um notável pseudônimo
Saí abrindo os olhos dos meus sinônimos
Apenas um tarja preto na minha assinatura
Um alusivo original à minha figura
Era bastante, mas não de fato
Se fora benévolo, fora pelo reles valor do ato

A vida me abria portas ilegítimas
Avançavam contra mim correntes marítimas
Se for provação, eu aturei
Se forem torturas, eu escapei
A resistência era vital para o tal sucesso
Mesmo que calado eu vivesse a escrever o processo

Os mundos viviam tempos de júbilo
Era lindo acreditar o que diziam os púlpitos
Minha vivacidade urgia, descrevendo efeitos
Via pessoas de todas as idades em belo proveito
Emitia, eu, milhões de palavras carregadas
Os homens intensos como o amanhecer e a madrugada
  
A humanidade tinha agora o sol
Era luminosidade e não mentira
Dali sim se retira
O poder do cósmico farol
Vivia dias de glória vendo tudo pela janela
Podia enfim ir, minha missão ali se encerra

 Tinha dito tudo e escrito mais
Constava na mente das pessoas
Coisas diversas, ruins e boas
Era contentamento nas massas gerais
Tinha crítica e cepticismo instalado
Um futuro que eu não sabia ter conquistado

E os seres não sabiam o que lhes atingira
Pegara os cérebros dissolutos e os cingira
Cingira com letra e língua clara
Dar-lhes-ia novo instinto e nova cara
A subversão traduzia o meu viver
A virtude coletiva era o meu prover

E estando a relatar e por assim dizer
Acho que tive tudo na minha vida
E ainda pelo que há de haver
Não tenho mais que uma pedida
Necessito que minha face seja jamais referida
Para que possa ser venturoso nos céus austrais
 
Dentre todos os homônimos e pseudônimos
Há um desejo anônimo em discorrer
Em dizer que há crise perceptiva
Que há possibilidade de belas vidas
 Que seja oculto o meu ser
Que se professe o bem do homem, o meu dizer.

Comentários

  1. Acredito muito que vá precisar ler outras vezes seu texto para compreendê-lo, mas não desistirei. kkkkkk!

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