(in) justiça


Um texto sujo. Sujo como o pensamento que antevê luxúria. Pensamento estéril, como o sentimento que sucede o gozo. Palavra curta, como o passo que ocorre após a queda. Mente pequena, como a verdade que legitima o império. Beleza caduca, como aquela que torna claros os olhos dos que sentem fome. Magia vulgar, como aquela que é truque desonesto de levar dinheiro das crianças.

Comércio falho, como aquele que lhe vende a alma. Negócio vazio, aquele que a equação lhe tira a vida. Esquina mórbida, que abriga mulheres e homens acessórios. Engrenagem absurda, aquela que usa pessoas no tráfico de dignidades. Divindade sórdida, aquela que lhe usurpa o direito à liberdade. Pela culpa, pelo medo, pela ganância. A antimatéria. O mal. O pecado dos que não quiseram a palavra, mas o pão.

Política vil, que se faz em torno do próprio umbigo. Música supérflua, a que faz ode ao poder econômico. Gente insana, aquela que morde a própria carne. Fumante passivo é o que mais morre, o membro decepado é o que mais dói, a verdade não dita é a que mais mata. O desejo não realizado é o que mais arrepende. O tiro não dado, o frio que sente o corpo nu, o espinho da rosa penetrando na pele da mão, o matricídio, o correio extraviado, a desatenção.

Dicionário infame, como aquele que nomeia o diabo, o maquiavélico e o ateu. Os lençóis do estupro, da pedofilia e da não-consciência dos atos. Da suspensão do julgamento moral e ético nas guerras contra o próximo. Das drogas adocicadas que se converteram em vício terminal. A tristeza não compartilhada. Do sentimento fulminado pela pressa dos trens metropolitanos. Do corpo perecível à dureza das máquinas de aço. 

Às fotos coloridas entediantes, uma frase do livro da história humana. À real obscuridade das fotos em preto e branco , um salve a todos os seres que tiveram que habitar na penumbra. Aos seres que passaram pela eternidade e tiveram como condenação a ausência de registro, à eles a falsa reparação que sugere as palavras "todos e tudo". Aos homens e mulheres ermos de sentido, dois corações (um que bombeia sangue e outro que bombeia sentimentos), um cérebro e um metabolismo que faça parecer real o que simulam os cinco sentidos. A gente sente para dentro também e é por dentro que se morre.

Competência e responsabilidade duram uma vida. Dois corpos não ocupam o mesmo lugar. Para dizer isto, existe a física, que explica a morte via colisão. Para desdizer, existe o sexo, que é visto meio enviesado por conservadores. Estes, que dominam o mundo, que mordem a fronha e conservam o centro da Terra em pleno fogo. Fogueiras que assam comida também queimam gente. Urgente, como um olho blasé. Como os mesmos trilhos do trem de todos os dias, que leva gente de todo credo. Credo! Para onde? Para um ponto no círculo e na circunferência geoide. 

Loucura, que tornaria o mundo mais tragável. Como a loucura dos psicopatas, que metrificam a barbárie e se infiltram no cortiço dos que não pecam. A santa demência dos que não podiam, dos que ignoravam e dos que foram tragados pelo absolutismo. O que se diz do sangue que mata o próprio corpo?  A violência retida nos olhos, a faca em punho. Discurso que delata o inocente, poesia que canta a opressão, o caminho do precipício, a água dos tubarões, a medicina da morte, a arte do negócio, a verdade da mentira. Dissenso. O desamor. A (in) justiça dos homens de hoje.

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