Nossas diferenças
Como repórter de Política,
frequento ambientes que não coincidem, exatamente, com a minha classe social.
Dado um certo deslocamento, que é natural, não chego a destoar tanto - eu
imagino - por conta da etiqueta que aprendi, com o tempo, a manejar, para garantir
certa discrição.
Esse intercâmbio de universos
(econômico, social e cultural) distintos, entretanto, faz parte da liturgia do
jornalismo, uma vez que contar fatos políticos, muitas vezes, depende de
transitar por espaços de poder e conviver - num certo nível de intimidade - com
pessoas que nunca frequentarão a minha casa.
A vivência com pessoas ligadas ao
poder, ou de classes sociais superiores, em atos políticos formais, festas,
solenidades, bares, cinemas, teatros e eventos acadêmicos, nesse sentido, gera
um estranhamento que sempre me assalta a imaginação, quando estou caminhando
pelas ruas do Centro do Recife, ou distraído na janela do ônibus.
"Por que nunca encontro
fulano na estação de BRT da Praça do Derby?" ou "Por que nunca vi
beltrano tomando um café no São Braz do Shopping Boa Vista?" são dúvidas
que me tomam, inconscientemente. Cheguei à conclusão de que existe, sim, um
abismo que se confirma no cotidiano. E é palpável.
Talvez por eu ter vivido parte da
minha vida numa cidade do interior, essas separações, pequenas fraturas sociais
me saltam aos olhos com certo espanto aqui no Recife, já que no interior, mesmo
ricos e pobres conseguem falar sobre os mesmos assuntos com mais naturalidade.
No interior, ricos e pobres se
vestem com a melhor roupa para assistir a um show de forró na festa do santo
padroeiro da cidade. Aqui no Recife, por sua vez, há uma incomunicabilidade -
perceptível no ar, eu diria - entre as pessoas que acompanham, "na
pipoca", um trio elétrico do Galo da Madrugada e as que assistem ao desfile
no camarote.
Pior é constatar como o dia a dia
do Centro do Recife, por exemplo, tornou-se um lugar impraticável para uma
convivência recreativa entre pessoas de universos socioeconômicos distintos.
É, antes, o lugar da plebe e da
carência, das pessoas que vivenciam o real implacável, daquelas que pechincham
o molho de coentro e o material escolar das crianças, das que se satisfazem com
a promoção de coxinha e copo de refrigerante por R$ 2. E muita gente rica, que
vive no ar condicionado, debaixo dos seus lustres, talvez não saiba o que, de
fato, isso é.
Me perco em vacilações sobre o
futuro: será que, se eu enriquecesse e ascendesse socialmente, abandonaria de
vez, também, esse universo de desafios reais que é o Centro da cidade ou a
periferia e suas ruas estreitas, de comércios ambulantes e informais?
Sinceramente não sei, mas tenho
certeza de que o mundo ideal é muito distante. Esses dois mundos, mínimos,
elementares, não se comunicam e é, talvez, um privilégio meu, enquanto
repórter, transitar entre duas faces tão desiguais da vida em sociedade. Enfim.
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