Ode à máquina
Às vezes, mas só às vezes, a gente escuta os freios do ônibus ranger.
Coloco a cabeça para fora da janela: como em uma gangorra, metade do automóvel já está dependurada. O penhasco escuro...
Mas nem senti o impacto, a derrapagem.
A gente só escuta o barulho da pastilha sendo roída pelo disco e quando pensa que não, estamos a um passo do inferno.
Essa poesia arriscada nasceu num dia 1º de janeiro. Cada data dessas é um aniversário da humanidade.
Apesar de si, o homem continua vivo.
Apesar das eternas férias de deus, continuamos como se diz: on the line.
Apesar do pesar desse universo, ainda mantemos a capacidade de correr, derrapar e frear à beira do penhasco.
Infelizmente, ainda comemos da própria carne para propagar o gene egoísta.
Não sei por quem os sinos dobram ou se essa geringonça é teleguiada.
Continuo sendo capaz de suportar a minha pobre existência.
É que às vezes faz bem cantar o pneu, ouvir os freios do caminhão rangerem.
Embora eu arregale os olhos de medo e covardia, posso sentir o sangue correr dentro das minhas veias. Das minhas veias íntegras.
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