Ninguém se importa se a história for recontada.


A história do nosso país remonta a descoberta de um novo mundo. A civilização aportou na Bahia, trazendo política, religião, cultura, erudição, moral, costume, fé e uma natureza, pressupondo complexidade de pensamento. Aqui vivia uma população ingênua e simiesca, sem qualquer propósito com os valores cristãos e de submissão ao clero e à coroa. Voltando sua credulidade às fontes de sua sobrevivência, desconhecendo a linguagem hierárquica, os nossos “índios” brasileiros não nutriam impurezas de espírito ou ambições desqualificadas, egocentradas, melhor dizendo, desvios de conduta justificados por interesses pessoais. Longe de Atenas, Alexandria ou Roma, os primeiros brasileiros desconheciam o preço das coisas, pois para eles ideias de valor vital eram a verdade e a felicidade ancoradas na convivência.

Corrupção tem a origem de seu significado inexprimível. Não se sabe em que momento da criação ou que explicação científica, genética ou psicológica se atribui, contudo o mistério nos leva a desacreditar num fim agradável. Traço perfeito delineia o horizonte sem nenhuma falha, íris tal qual caleidoscópio da precisão, mas a que se confere o tropeço? A indagação topa as caravelas portuguesas que desembarcaram em Porto Seguro. Um recuo muito maior pode ser feito na história, mas adotemos ali, o limiar do nosso sofisma: por que o brasileiro carrega esse estigma corruptível? O homem cordial, personalista, altruísta por interesse, negociador de preços e subornos, de reputação desconfiável, mestiço sem procedência definida, filho de todos e de ninguém, o bastardo devasso, confiado à boa vontade do destino, um povo de boa-fé de mercado, de estilo satírico, jeitoso, amoldável, fadado a ocupar lugares prestigiados na plateia da terceira classe, desconfigurado, copiador, romântico e cômico, brasileiro.

Tantas definições ensinadas pela escola do mundo ao filho de pai medíocre, mãe grandiosa, porém soberba, o Brasil posto no seio de orquídeas sangrentas, flores delirantes e raras, algumas levianas. Ao norte um vale de silício esmagador e imprescindível, o Édipo filho da Inglaterra. Parentes negros de luminosa ascendência paternal reavivam teu âmago, consumindo mais da metade do teu corpo híbrido. Eis que um clamor esquálido, mas verdadeiro se impõe à nossa consciência.

Entre as cores da nossa aquarela, enleio-me ao ver o Brasil. O rumor da tua voz trepidante, que é séria e altiva, profere-nos a esperança gestada em 1500 d. C. Pequenas criaturas nasceram em teu organismo, fazendo imaginar o quão caótico é o teu corpo genérico, fabuloso, miscigenado, teu metabolismo infindo e inquieto reflete a homérica identidade indefinida que ostentas. E, às vezes, cansados de esbarrarmos na tua superfície, na tua epiderme ainda reacionária por definição, cometemos a injustiça de desistirmos de ti, não respeitando o teu passado, teus (res) sentimentos, a tua idiossincrasia. Sabemos que sucumbes às fraquezas, mas nem por isso, deixas de ser uma imponente pessoa, que sempre nos traz prazer e surpresa, senão, já haveria morrido, dados os atentados terroristas acontecidos. Devo-te realmente fazer essa apologia testamentária, cumprindo assim meu dever patriótico, ufanista, cristão, moral e cívico.


A pergunta que refaço diariamente, diuturnamente, lamentando ou esperando meu gentílico: quando? Se for hoje, bem. O que é, verdadeiramente, não sei, mas pode ser a morte, a redenção, a verdade ou a desonestidade. Pode ser a revolução ou a concordância com que já lidamos rotineiramente. Brasil errante, eu não te amo. O que tenho transformado em verborragia está enraizado no teu DNA. Difamações, tolices, epifanias, grandezas, corrupções, miscigenações, disputas, ideologias e alienações, charlatanices, amiguismos, achismos, parentismos, heterossexualismos e homossexualidades, crentianismos, oligarquias, descobrimentos, pioneirismos, manias de grandeza, loucuras, políticas e politicagens, culturas de massa, popular, de gueto, violência, sexualidade, prostituição e capitalismo selvagem, ditadura, mídia sado-masoquista, tradições, universidades e ciências, maquinismos, retrocesso, redes sociais, ordem e progresso, vertigens, regionalismos, parnasianismos e modernismos, contação de histórias, advogadas nossas, Pedro I e Luiz Inácio, os índios e Cabral, entre outros seres estranhos: Brasil.

Comentários

Postagens mais visitadas